Passados os primeiros momentos de encantamento, o papa Francisco começou logo a mostrar seu estilo, seu jeito latino-americano, seu desejo de servir a Igreja Católica e a humanidade de corpo e alma. Tantos detalhes chamaram a atenção, como a moradia na Casa Santa Marta, em vez do palácio apostólico; a dispensa de muitos protocolos; seu jeito de pastor de almas; a forma direta e simples de falar...
Mas tudo isso, embora significativo, ainda não diz tudo sobre a novidade do primeiro papa não europeu, depois de muitos séculos, primeiro latino-americano, primeiro papa jesuíta, com jeito de franciscano... Francisco tem clareza sobre sua missão mais urgente, na condição de Sucessor de Pedro: confirmar os irmãos na fé, reanimá-los, dar-lhes novamente certeza e segurança interior, superar certo desalento e baixa auto-estima na Igreja, restituir ao povo católico a alegria do Evangelho, a identificação com a própria Igreja e o senso de pertença a ela.
Sabe que sua missão é resgatar a credibilidade da Igreja, ferida por muitos escândalos decorrentes de pecados e fraquezas daqueles que deveriam ser reconhecidos como testemunhas fidedignas do Evangelho da vida e da esperança diante do mundo... Francisco sabe que esta credibilidade só é recuperada com a retidão de intenções e atitudes, amor à verdade e sincera humildade. E ele convidou todos os membros da Igreja a fazerem isso, empreendendo um verdadeiro caminho de conversão a Cristo e seu Evangelho.
Muitos, talvez, esperavam imediatas e até espetaculares reformas na Cúria Romana e nos organismos de governo, que ajudam o Papa em sua missão universal. Francisco começou pedindo reformas nas atitudes e nas disposições de todos os filhos da Igreja; as reformas administrativas da Santa Sé chegam aos poucos e as da Cúria romana ainda devem chegar. Ninguém tenha a ilusão de que, na Igreja, tudo depende só da Cúria romana; Francisco tem falado mais vezes da necessária participação de todos e que cada membro da Igreja faça bem a sua parte, em vista da saúde do corpo inteiro.
Francisco quer uma Igreja que não seja auto-referencial, nem fechada sobre si mesma, mas discípula de Cristo e servidora do Evangelho para o mundo. Na Exortação Apostólica Evangelii Gaudium (“A Alegria do Evangelho”), ele apresentou as prioridades da missão evangelizadora no mundo atual: católicos felizes e agradecidos pela fé, percebida como dom precioso a ser compartilhado generosamente; uma Igreja que se faz missionária e se coloca em estado permanente de missão; a conversão constante ao autêntico espírito do Evangelho e a superação do “espírito mundano”, constante tentação para os cristãos e a Igreja; a saída para as periferias humanas e sociais e a solidariedade concreta em relação aos pobres.
Há muito para se fazer! Coragem, Papa Francisco, coragem! Deus o ilumine e guarde! E nós, além da admiração pelo Papa vindo da América Latina, também o acompanhemos neste esforço. Coragem, povo de Deus, coragem!
Cardeal Odilo P. Scherer, arcebispo de São Paulo
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