As tramas na arte mistagógica

Sexta, 03 Junho 2022 18:24 Escrito por  Pe. João Mendonça, SDB
As tramas na arte mistagógica iStock.com
Sem a comunicação não é possível uma verdadeira integração das relações entre nós, seres humanos. Por conseguinte, a comunicação é uma arte irrenunciável na construção do aprendizado.    

No artigo anterior refletimos que o nosso Projeto de Vida mistagógico – comunicação/educação – passa pela contemplação de saber ver uma sociedade esfacelada, líquida. Isso quer dizer que, sem a comunicação, não é possível uma verdadeira integração das relações entre nós, seres humanos. Por conseguinte, a comunicação é uma arte irrenunciável na construção do aprendizado. Paulo Freire defendia claramente esse posicionamento crítico.

 

O drama do não diálogo – não saber ler e pensar

Quando a educação não é capaz de transgredir o mutismo, ela torna-se improdutiva, impotente. Para acontecer de fato a educação, o mistagogo – o educador – precisa saber ler. Isso quer dizer que ele não pode cair na tentação de apenas transmitir o saber, mas deve envolver o outro sujeito na arte da coparticipação do ato de ler, como defendia Paulo Freire. Trata-se de um encontro de sujeitos interlocutores que buscam o significado de suas leituras. O não diálogo é considerado pelo Papa Francisco como intelectualismo abstrato, ou seja, nele não existe a capacidade de enxergar a realidade do outro, muito menos da sociedade. É uma forma de “falar por falar”.

 

Na contramão desse drama contemporâneo está a capacidade do encontro, do saber ler e pensar, que é olhar o outro, cruzar os olhares, perceber e aceitar as diferenças sem medo da novidade do outro. É ter tempo para o encontro sem a pressão do relógio. São atitudes que, na sociedade do “sem tempo”, desafia todos nós, mistagogos da comunicação educativa, a repensar o diálogo como condição positiva de mudança.

 

O drama do não saber escutar – não saber falar e escrever

Dom Bosco dizia que a “educação é coisa do coração”, ou seja, é uma atitude de escuta, de ouvir o outro, de colocar o ouvido no chão para ouvir os passos do outro, sem pressa. Escutar não pode ser confundido com uma fala sem ressonância, pois os sujeitos são pensantes. Quando não existe a capacidade de escuta não há comunicação, e se não há processo de comunicação, a narrativa da história perde-se na frenética corrida do invadir o sujeito, manipular suas narrativas e rotular sua existência.

 

O Papa Francisco defende a ideia de que, quando “ouvimos com o coração, o outro sente-se acolhido, não julgado, livre para contar sua vivência e o próprio caminho espiritual” (Homilia do dia 10/10/2021, na abertura do Sínodo 2023). É essa prática que o Sistema Preventivo proposto por Dom Bosco amplia na ação educativo-evangelizadora, quando favorece ao jovem narrar sua história, sonhar com o futuro e libertar-se do “presenteísmo”.

 

Superar os dramas com compreensão, interpretação e ação

A formação que recebemos na faculdade não nos preparou para mudanças de paradigmas; não se falava na época de Projeto Pessoal de Vida e fomos informados com os manuais e teorias pedagógicas. Tratava-se de uma época diferente, que foi importante para as bases do nosso agir hoje. Não podemos retirar de nossas mentes e coração o que aprendemos.

 

Contudo, é nosso dever saber compreender a realidade de hoje, o despertar da era digital, da crise humanista, do renascer da informação e do cultivo do saber. Portanto, no Projeto Pessoal de Vida que cada um de nós tem o compromisso de construir, é necessário sair do “sempre foi assim” e superar o imobilismo intelectualista abstrato para alcançar a mistagogia educativa entre interlocutores, sujeitos, superando a visão simplista de “um que sabe e outro que não sabe”.

 

Ser educador e educadora na dinâmica mistagógica é compreender de forma sistêmica as vivências dos educandos e a herança cultural; é interpretar, à luz da mudança de época líquida e cansada, o valor do protagonismo educativo, como está no Pacto Educativo Global proposto pelo Papa Francisco. É sair a campo, no encontro cotidiano com os educandos, seus familiares e a comunidade educativa. Enfim, com uma nova postura educativa comprometida com a transformação social, como dizia Dom Bosco, é participar na construção do “bom cristão e honesto cidadão”.

 

Padre João da Silva Mendonça Filho, SDB, é mestre em Educação pela Pontifica Universidade Salesiana de Roma/Itália com especialização em Metodologia Vocacional, e pós-graduado em Comunicação pelo SEPAC/SP e PUC/SP.

 

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As tramas na arte mistagógica

Sexta, 03 Junho 2022 18:24 Escrito por  Pe. João Mendonça, SDB
As tramas na arte mistagógica iStock.com
Sem a comunicação não é possível uma verdadeira integração das relações entre nós, seres humanos. Por conseguinte, a comunicação é uma arte irrenunciável na construção do aprendizado.    

No artigo anterior refletimos que o nosso Projeto de Vida mistagógico – comunicação/educação – passa pela contemplação de saber ver uma sociedade esfacelada, líquida. Isso quer dizer que, sem a comunicação, não é possível uma verdadeira integração das relações entre nós, seres humanos. Por conseguinte, a comunicação é uma arte irrenunciável na construção do aprendizado. Paulo Freire defendia claramente esse posicionamento crítico.

 

O drama do não diálogo – não saber ler e pensar

Quando a educação não é capaz de transgredir o mutismo, ela torna-se improdutiva, impotente. Para acontecer de fato a educação, o mistagogo – o educador – precisa saber ler. Isso quer dizer que ele não pode cair na tentação de apenas transmitir o saber, mas deve envolver o outro sujeito na arte da coparticipação do ato de ler, como defendia Paulo Freire. Trata-se de um encontro de sujeitos interlocutores que buscam o significado de suas leituras. O não diálogo é considerado pelo Papa Francisco como intelectualismo abstrato, ou seja, nele não existe a capacidade de enxergar a realidade do outro, muito menos da sociedade. É uma forma de “falar por falar”.

 

Na contramão desse drama contemporâneo está a capacidade do encontro, do saber ler e pensar, que é olhar o outro, cruzar os olhares, perceber e aceitar as diferenças sem medo da novidade do outro. É ter tempo para o encontro sem a pressão do relógio. São atitudes que, na sociedade do “sem tempo”, desafia todos nós, mistagogos da comunicação educativa, a repensar o diálogo como condição positiva de mudança.

 

O drama do não saber escutar – não saber falar e escrever

Dom Bosco dizia que a “educação é coisa do coração”, ou seja, é uma atitude de escuta, de ouvir o outro, de colocar o ouvido no chão para ouvir os passos do outro, sem pressa. Escutar não pode ser confundido com uma fala sem ressonância, pois os sujeitos são pensantes. Quando não existe a capacidade de escuta não há comunicação, e se não há processo de comunicação, a narrativa da história perde-se na frenética corrida do invadir o sujeito, manipular suas narrativas e rotular sua existência.

 

O Papa Francisco defende a ideia de que, quando “ouvimos com o coração, o outro sente-se acolhido, não julgado, livre para contar sua vivência e o próprio caminho espiritual” (Homilia do dia 10/10/2021, na abertura do Sínodo 2023). É essa prática que o Sistema Preventivo proposto por Dom Bosco amplia na ação educativo-evangelizadora, quando favorece ao jovem narrar sua história, sonhar com o futuro e libertar-se do “presenteísmo”.

 

Superar os dramas com compreensão, interpretação e ação

A formação que recebemos na faculdade não nos preparou para mudanças de paradigmas; não se falava na época de Projeto Pessoal de Vida e fomos informados com os manuais e teorias pedagógicas. Tratava-se de uma época diferente, que foi importante para as bases do nosso agir hoje. Não podemos retirar de nossas mentes e coração o que aprendemos.

 

Contudo, é nosso dever saber compreender a realidade de hoje, o despertar da era digital, da crise humanista, do renascer da informação e do cultivo do saber. Portanto, no Projeto Pessoal de Vida que cada um de nós tem o compromisso de construir, é necessário sair do “sempre foi assim” e superar o imobilismo intelectualista abstrato para alcançar a mistagogia educativa entre interlocutores, sujeitos, superando a visão simplista de “um que sabe e outro que não sabe”.

 

Ser educador e educadora na dinâmica mistagógica é compreender de forma sistêmica as vivências dos educandos e a herança cultural; é interpretar, à luz da mudança de época líquida e cansada, o valor do protagonismo educativo, como está no Pacto Educativo Global proposto pelo Papa Francisco. É sair a campo, no encontro cotidiano com os educandos, seus familiares e a comunidade educativa. Enfim, com uma nova postura educativa comprometida com a transformação social, como dizia Dom Bosco, é participar na construção do “bom cristão e honesto cidadão”.

 

Padre João da Silva Mendonça Filho, SDB, é mestre em Educação pela Pontifica Universidade Salesiana de Roma/Itália com especialização em Metodologia Vocacional, e pós-graduado em Comunicação pelo SEPAC/SP e PUC/SP.

 

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