A espiritualidade do Sistema Preventivo

Quarta, 18 Dezembro 2013 10:44 Escrito por 
Preocupo-me muito com as possíveis distorções que possam nascer das múltiplas leituras que são feitas do Projeto de Dom Bosco. A minha maior preocupação está relacionada àqueles estudos que podem reduzir o projeto a uma simples doutrina pedagógica, a uma corrente psicológica ou antropológica, em princípios que traduzam, exclusivamente, paradigmas construídos na dimensão terrena de nosso ser e existir.

A grande novidade do projeto operativo de Dom Bosco, a sua genialidade, consiste no seguimento de Jesus, na experiência do Deus Criador, ou seja, está contida em sua espiritualidade, na capacidade de ofertar aos educadores as condições ideais para superarem os grandes desafios que impactam, de forma negativa, a vida dos jovens.

O Santo dos Jovens, durante toda a sua existência, esteve em sintonia com aspectos importantes da vida pública de Nosso Senhor Jesus Cristo. É fácil identificar, nos relatos históricos, a relação de Dom Bosco com o Cristo Sacerdote, modelo de consagração perfeita e de doação plena ao Projeto da Salvação; com o Jesus histórico, o Deus feito homem, que permitiu a cada um de nós tornar-se filho adotivo do Pai e participar da bem-aventurada vida divina.

Logo, ao tecer o seu sistema, Dom Bosco, além de ter sido influenciado por diferentes pessoas e correntes de pensamento, buscou inspiração nos textos da Sagrada Escritura, especialmente do Novo Testamento. É possível notar, por meio de uma pesquisa bem elaborada, como o projeto operativo de Dom Bosco possui uma fundamentação evangélica decisiva para a salvação da juventude.

 

Alguns elementos

Na figura do Bom Pastor (Jo 10,11-18), Dom Bosco inaugura, em seu projeto, uma forma diferente de ser pastor: o educador amigo dos pequenos, humildes e marginalizados ao ponto de se fazer um com eles; o educador que dá a vida por suas ovelhas.

Ao pesquisar a vida de Dom Bosco, inúmeras passagens comprovam a sua atitude de “excelente pastor”, dentre elas: suas caminhadas pelas ruas de Turim indo ao encontro dos jovens desfavorecidos, o aparecimento de inúmeros inimigos em decorrência de sua opção fundamental pelos jovens e as tentativas fracassadas para calarem sua voz.  

Na passagem daOvelha Perdida (Lc 15,3-7), Dom Bosco demonstra um amor incondicional para cada jovem. Para ele, todos possuem o mesmo valor, a mesma dignidade, e são merecedores de uma atenção especial por parte dos educadores.

Na parábola do Bom Samaritano (Lc 10, 30-35), fica evidenciado para Dom Bosco que a ação cristã não pode levar em consideração o “status” do outro, daquele a quem prestamos uma atenção, uma caridade. O que importa é a atitude de bondade, a doação completa ao irmão. Essa é a atitude que o projeto de Dom Bosco quer  presente em seus educadores e nos jovens. A simbologia da prática do bem, por exemplo, é visível em Domingos Sávio quando da epidemia da cólera.

O Sacrifício da Cruz (Lc 23, 33-46) e a Ressurreição (Lc 24), presentes de forma clara no “Sonho do Caramanchão e as Rosas”, definem que o projeto de Dom Bosco, apesar de repleto de espinhos, de obstáculos e desgostos, jamais sucumbe ao desânimo, projetando um futuro de superação de todas as situações que ferem a dignidade da pessoa humana.

Em Maria, Mãe e Mestra, (Jo 2,1-12), o projeto de Dom Bosco assume a importância da mediação de Nossa Senhora entre a história e a glória e de seu auxílio na nossa  relação com Jesus Cristo. Maria é tomada como exemplo de vida, como alguém que deve guiar e alimentar nossos projetos pessoais e comunitários.

Do episódio de Pedro e as chaves (Mt, 16, 13-19), Dom Bosco retira sua compreensão de que a Igreja e o seu guia terrestre, o Papa, representam um espaço/ambiente propício, por excelência, para a experiência cristã: a vida comunitária envolvida pelos sacramentos.

 

A salvação no projeto de Dom Bosco

Em todas as passagens bíblicas apresentadas podemos perceber que a centralidade da espiritualidade de Dom Bosco é a salvação do jovem: uma salvação da alma, do Paraíso, concreta, contextualizada no dia a dia histórico.

Uma salvação em profunda sintonia com a Igreja, enquanto sinal sacramental, lugar, espaço e ambiente, onde o jovem aprofundará sua vivência na Graça, construindo estruturas que evitem a consolidação de atitudes conectadas com o desamor (Domingos Sávio: “antes morrer do que pecar”).

É uma salvação capaz de introduzir na vida juvenil a Pedagogia do Dever, do viver bem na alegria, no trabalho, no estudo, no amor a Deus e ao próximo e, sobretudo, na busca constante dos protagonismos histórico e celestial.

É uma salvação conectada com a experiência de Deus no dia a dia histórico, com o seguimento de Jesus, sob a iluminação do Espírito Santo, tendo como grande finalidade a construção de uma pessoa verdadeiramente madura, de personalidade, capaz de interagir com a vida, valorizando-a e definindo relações promotoras de humanização.

Para Dom Bosco, o processo de salvação – humanização já, santificação idem – acontecia na medida em que a pessoa humana se responsabilizava pelo outro, servindo-o, dando-se por inteiro, assumindo os grandes traços da personalidade e das atitudes de Jesus na relação com seus contemporâneos: docilidade, mansidão, bondade, humildade, modéstia, acolhida, alteridade e reciprocidade.

 

A comunidade educativa como espaço da espiritualidade

Levando em consideração o que foi colocado até agora e a guisa de conclusão, é possível sinalizar que a existência de uma comunidade educativa, exemplo de unidade e comunhão fraterna, comunicadora de uma Igreja viva e atuante, isto é, pastoral, é uma exigência vital para que a salvação do jovem aconteça de fato. Aconteça, também, pela dimensão pedagógica, enquanto meio natural e auxiliar no desenvolvimento de agentes de uma história voltada para o imperativo de uma civilização do amor.

 

José Augusto Abreu Aguiaré professor da Rede Salesiana de Escolas, no Instituto Nossa Senhora da Glória, em Macaé, RJ. 

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Última modificação em Quarta, 02 Abril 2014 15:56

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A espiritualidade do Sistema Preventivo

Quarta, 18 Dezembro 2013 10:44 Escrito por 
Preocupo-me muito com as possíveis distorções que possam nascer das múltiplas leituras que são feitas do Projeto de Dom Bosco. A minha maior preocupação está relacionada àqueles estudos que podem reduzir o projeto a uma simples doutrina pedagógica, a uma corrente psicológica ou antropológica, em princípios que traduzam, exclusivamente, paradigmas construídos na dimensão terrena de nosso ser e existir.

A grande novidade do projeto operativo de Dom Bosco, a sua genialidade, consiste no seguimento de Jesus, na experiência do Deus Criador, ou seja, está contida em sua espiritualidade, na capacidade de ofertar aos educadores as condições ideais para superarem os grandes desafios que impactam, de forma negativa, a vida dos jovens.

O Santo dos Jovens, durante toda a sua existência, esteve em sintonia com aspectos importantes da vida pública de Nosso Senhor Jesus Cristo. É fácil identificar, nos relatos históricos, a relação de Dom Bosco com o Cristo Sacerdote, modelo de consagração perfeita e de doação plena ao Projeto da Salvação; com o Jesus histórico, o Deus feito homem, que permitiu a cada um de nós tornar-se filho adotivo do Pai e participar da bem-aventurada vida divina.

Logo, ao tecer o seu sistema, Dom Bosco, além de ter sido influenciado por diferentes pessoas e correntes de pensamento, buscou inspiração nos textos da Sagrada Escritura, especialmente do Novo Testamento. É possível notar, por meio de uma pesquisa bem elaborada, como o projeto operativo de Dom Bosco possui uma fundamentação evangélica decisiva para a salvação da juventude.

 

Alguns elementos

Na figura do Bom Pastor (Jo 10,11-18), Dom Bosco inaugura, em seu projeto, uma forma diferente de ser pastor: o educador amigo dos pequenos, humildes e marginalizados ao ponto de se fazer um com eles; o educador que dá a vida por suas ovelhas.

Ao pesquisar a vida de Dom Bosco, inúmeras passagens comprovam a sua atitude de “excelente pastor”, dentre elas: suas caminhadas pelas ruas de Turim indo ao encontro dos jovens desfavorecidos, o aparecimento de inúmeros inimigos em decorrência de sua opção fundamental pelos jovens e as tentativas fracassadas para calarem sua voz.  

Na passagem daOvelha Perdida (Lc 15,3-7), Dom Bosco demonstra um amor incondicional para cada jovem. Para ele, todos possuem o mesmo valor, a mesma dignidade, e são merecedores de uma atenção especial por parte dos educadores.

Na parábola do Bom Samaritano (Lc 10, 30-35), fica evidenciado para Dom Bosco que a ação cristã não pode levar em consideração o “status” do outro, daquele a quem prestamos uma atenção, uma caridade. O que importa é a atitude de bondade, a doação completa ao irmão. Essa é a atitude que o projeto de Dom Bosco quer  presente em seus educadores e nos jovens. A simbologia da prática do bem, por exemplo, é visível em Domingos Sávio quando da epidemia da cólera.

O Sacrifício da Cruz (Lc 23, 33-46) e a Ressurreição (Lc 24), presentes de forma clara no “Sonho do Caramanchão e as Rosas”, definem que o projeto de Dom Bosco, apesar de repleto de espinhos, de obstáculos e desgostos, jamais sucumbe ao desânimo, projetando um futuro de superação de todas as situações que ferem a dignidade da pessoa humana.

Em Maria, Mãe e Mestra, (Jo 2,1-12), o projeto de Dom Bosco assume a importância da mediação de Nossa Senhora entre a história e a glória e de seu auxílio na nossa  relação com Jesus Cristo. Maria é tomada como exemplo de vida, como alguém que deve guiar e alimentar nossos projetos pessoais e comunitários.

Do episódio de Pedro e as chaves (Mt, 16, 13-19), Dom Bosco retira sua compreensão de que a Igreja e o seu guia terrestre, o Papa, representam um espaço/ambiente propício, por excelência, para a experiência cristã: a vida comunitária envolvida pelos sacramentos.

 

A salvação no projeto de Dom Bosco

Em todas as passagens bíblicas apresentadas podemos perceber que a centralidade da espiritualidade de Dom Bosco é a salvação do jovem: uma salvação da alma, do Paraíso, concreta, contextualizada no dia a dia histórico.

Uma salvação em profunda sintonia com a Igreja, enquanto sinal sacramental, lugar, espaço e ambiente, onde o jovem aprofundará sua vivência na Graça, construindo estruturas que evitem a consolidação de atitudes conectadas com o desamor (Domingos Sávio: “antes morrer do que pecar”).

É uma salvação capaz de introduzir na vida juvenil a Pedagogia do Dever, do viver bem na alegria, no trabalho, no estudo, no amor a Deus e ao próximo e, sobretudo, na busca constante dos protagonismos histórico e celestial.

É uma salvação conectada com a experiência de Deus no dia a dia histórico, com o seguimento de Jesus, sob a iluminação do Espírito Santo, tendo como grande finalidade a construção de uma pessoa verdadeiramente madura, de personalidade, capaz de interagir com a vida, valorizando-a e definindo relações promotoras de humanização.

Para Dom Bosco, o processo de salvação – humanização já, santificação idem – acontecia na medida em que a pessoa humana se responsabilizava pelo outro, servindo-o, dando-se por inteiro, assumindo os grandes traços da personalidade e das atitudes de Jesus na relação com seus contemporâneos: docilidade, mansidão, bondade, humildade, modéstia, acolhida, alteridade e reciprocidade.

 

A comunidade educativa como espaço da espiritualidade

Levando em consideração o que foi colocado até agora e a guisa de conclusão, é possível sinalizar que a existência de uma comunidade educativa, exemplo de unidade e comunhão fraterna, comunicadora de uma Igreja viva e atuante, isto é, pastoral, é uma exigência vital para que a salvação do jovem aconteça de fato. Aconteça, também, pela dimensão pedagógica, enquanto meio natural e auxiliar no desenvolvimento de agentes de uma história voltada para o imperativo de uma civilização do amor.

 

José Augusto Abreu Aguiaré professor da Rede Salesiana de Escolas, no Instituto Nossa Senhora da Glória, em Macaé, RJ. 

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