Ser cristão leigo ou leiga em missão

Terça, 29 Setembro 2020 18:05 Escrito por  Pe. João Mendonça, SDB
Ser cristão leigo ou leiga em missão iStock.com
Como discernir: neste sétimo artigo iremos refletir que não basta ser batizado, é preciso ir mais além e assumir a missão de evangelizar.    

O Papa São João Paulo II dedicou uma importante exortação apostólica, após o Sínodo sobre a missão dos cristãos, aos leigos e leigas no mundo: a Christifideles Laici (CFL), de 1988. Foi uma ocasião muito fecunda para repensar, à luz do Concílio Vaticano II e do Sínodo, o resgate do Batismo como principal fonte de vida e missão para todos os batizados.

 

A CNBB, em 2018, dedicou todo o ano para refletir sobre a natureza e missão dos cristãos leigos e leigas no Brasil. Estas iniciativas reforçam o grande valor do ser cristão, porque “o significado fundamental deste Sínodo e, consequentemente, o seu fruto mais precioso, é que os fiéis leigos escutem o chamamento de Cristo para trabalharem na Sua vinha, para tomar parte viva, consciente e responsável na missão da Igreja, nesta hora magnífica e dramática da história, no limiar do terceiro milênio. Novas situações, tanto eclesiais como sociais, econômicas, políticas e culturais, reclamam hoje, com uma força toda particular, a ação dos fiéis leigos. Se o desinteresse foi sempre inaceitável, o tempo presente torna-o ainda mais culpável. Não é lícito a ninguém ficar inativo” (CFL, 3).

 

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Cristãos leigos e leigas: natureza e missão

Não há “lugar para o ócio na vinha do Senhor” (CFL, 3). Isto significa que ser cristão é um chamado a sair de si mesmo, deixar de ser autorreferência e comprometer-se com a vivência fecunda da missão da Igreja. Não podemos ter medo de encarar o mundo com seus desafios, obstáculos e perigos. Devemos assumir, com a força do Espírito Santo, a natureza mesma de ser ungido e enviado para a missão. Eis aqui a natureza própria do ser cristão. A laicidade não é o desconhecimento ou sinônimo de secularização, mas “tornar-se protagonistas e, em certa medida, criadores de uma nova cultura humanista, é uma exigência ao mesmo tempo universal e individual” (CFL, 5).

 

Quem são, portanto, os cristãos leigos e leigas? Tanto o Concílio Vaticano II como a exortação sobre a missão afirmam categoricamente: “Por leigos — assim os descreve a Constituição Lumen gentium — entendem se aqui todos os cristãos que não são membros da sagrada Ordem ou do estado religioso reconhecido pela Igreja, isto é, os fiéis que, incorporados em Cristo pelo Batismo, constituídos em Povo de Deus e tornados participantes, a seu modo, do múnus sacerdotal, profético e real de Cristo, exercem pela parte que lhes toca, na Igreja e no mundo, a missão de todo o povo cristão” (CFL, 9). O que está sublinhando é o essencial da identidade laical.

 

Obstáculos a serem vencidos

Os cristãos leigos e leigas, infelizmente, ainda vivem prisioneiros de alguns limites que os impedem de viver plenamente a missão. Alguns se refugiam apenas nas ações internas das comunidades, quase deixando-se clericalizar; por outro lado, muitos clérigos, sedentos de poder e com medo de perder espaço na missão, não deixam ou não aceitam que a missão dos cristãos leigos, fundada no Batismo, radicaliza que os mesmos “são pessoas que vivem a vida normal no mundo, estudam, trabalham, estabelecem relações amigáveis, sociais, profissionais, culturais etc. O Concílio considera essa sua condição não simplesmente como um dado exterior e ambiental, mas como uma realidade destinada a encontrar em Jesus Cristo a plenitude do seu significado” (CFL, 15).

 

Isto não impede que haja serviços laicais nas comunidades, porém, não aprisiona ninguém dentro das estruturas eclesiais. O cristão leigo não pode limitar a missão evangelizadora aos grupos, aos ministérios, às associações e aos movimentos, como se a missão da Igreja fosse uma forma de conservação da religião do Templo.

 

Ser cristão leigo e leiga requer assumir hoje, sobretudo nestes tempos de retrocesso eclesial, que “o mundo torne-se assim o ambiente e o meio da vocação cristã dos fiéis leigos”, pois também ele está destinado a dar glória a Deus Pai em Cristo. O Concílio pode, então, indicar qual o sentido próprio e peculiar da vocação divina dirigida aos fiéis leigos. Estes não são chamados a deixar o lugar que ocupam no mundo.

 

O Batismo não os tira de modo nenhum do mundo, como sublinha o apóstolo Paulo: “Irmãos, fique cada um de vós diante de Deus na condição em que estava quando foi chamado” (1 Cor 7, 24); mas confia-lhes uma vocação que diz respeito a essa mesma condição intra-mundana: pois, os fiéis leigos “são chamados por Deus para que aí, exercendo o seu próprio ofício, inspirados pelo espírito evangélico, concorram para a santificação do mundo a partir de dentro, como o fermento, e deste modo manifestem Cristo aos outros, antes de mais, pelo testemunho da própria vida, pela irradiação da sua fé, esperança e caridade”.

 

Dessa forma, o estar e o agir no mundo são para os fiéis leigos uma realidade, não só antropológica e sociológica, mas também e especificamente teológica e eclesial, pois, é na sua situação intra-mundana que Deus manifesta o Seu plano e comunica a especial vocação de “procurar o Reino de Deus tratando das realidades temporais e ordenando-as segundo Deus” (CFL, 15).

 

É preciso retornar ao essencial da natureza do laicato para que a Igreja seja de fato, como pede o Papa Francisco: “Uma Igreja em saída para as periferias existenciais”.

 

Padre João da Silva Mendonça Filho, SDB, é mestre em Educação pela Pontifica Universidade Salesiana de Roma/Itália com especialização em Metodologia Vocacional, e pós-graduado em Comunicação pelo SEPAC/SP e PUC/SP.

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Ser cristão leigo ou leiga em missão

Terça, 29 Setembro 2020 18:05 Escrito por  Pe. João Mendonça, SDB
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Como discernir: neste sétimo artigo iremos refletir que não basta ser batizado, é preciso ir mais além e assumir a missão de evangelizar.    

O Papa São João Paulo II dedicou uma importante exortação apostólica, após o Sínodo sobre a missão dos cristãos, aos leigos e leigas no mundo: a Christifideles Laici (CFL), de 1988. Foi uma ocasião muito fecunda para repensar, à luz do Concílio Vaticano II e do Sínodo, o resgate do Batismo como principal fonte de vida e missão para todos os batizados.

 

A CNBB, em 2018, dedicou todo o ano para refletir sobre a natureza e missão dos cristãos leigos e leigas no Brasil. Estas iniciativas reforçam o grande valor do ser cristão, porque “o significado fundamental deste Sínodo e, consequentemente, o seu fruto mais precioso, é que os fiéis leigos escutem o chamamento de Cristo para trabalharem na Sua vinha, para tomar parte viva, consciente e responsável na missão da Igreja, nesta hora magnífica e dramática da história, no limiar do terceiro milênio. Novas situações, tanto eclesiais como sociais, econômicas, políticas e culturais, reclamam hoje, com uma força toda particular, a ação dos fiéis leigos. Se o desinteresse foi sempre inaceitável, o tempo presente torna-o ainda mais culpável. Não é lícito a ninguém ficar inativo” (CFL, 3).

 

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Quem são, portanto, os cristãos leigos e leigas? Tanto o Concílio Vaticano II como a exortação sobre a missão afirmam categoricamente: “Por leigos — assim os descreve a Constituição Lumen gentium — entendem se aqui todos os cristãos que não são membros da sagrada Ordem ou do estado religioso reconhecido pela Igreja, isto é, os fiéis que, incorporados em Cristo pelo Batismo, constituídos em Povo de Deus e tornados participantes, a seu modo, do múnus sacerdotal, profético e real de Cristo, exercem pela parte que lhes toca, na Igreja e no mundo, a missão de todo o povo cristão” (CFL, 9). O que está sublinhando é o essencial da identidade laical.

 

Obstáculos a serem vencidos

Os cristãos leigos e leigas, infelizmente, ainda vivem prisioneiros de alguns limites que os impedem de viver plenamente a missão. Alguns se refugiam apenas nas ações internas das comunidades, quase deixando-se clericalizar; por outro lado, muitos clérigos, sedentos de poder e com medo de perder espaço na missão, não deixam ou não aceitam que a missão dos cristãos leigos, fundada no Batismo, radicaliza que os mesmos “são pessoas que vivem a vida normal no mundo, estudam, trabalham, estabelecem relações amigáveis, sociais, profissionais, culturais etc. O Concílio considera essa sua condição não simplesmente como um dado exterior e ambiental, mas como uma realidade destinada a encontrar em Jesus Cristo a plenitude do seu significado” (CFL, 15).

 

Isto não impede que haja serviços laicais nas comunidades, porém, não aprisiona ninguém dentro das estruturas eclesiais. O cristão leigo não pode limitar a missão evangelizadora aos grupos, aos ministérios, às associações e aos movimentos, como se a missão da Igreja fosse uma forma de conservação da religião do Templo.

 

Ser cristão leigo e leiga requer assumir hoje, sobretudo nestes tempos de retrocesso eclesial, que “o mundo torne-se assim o ambiente e o meio da vocação cristã dos fiéis leigos”, pois também ele está destinado a dar glória a Deus Pai em Cristo. O Concílio pode, então, indicar qual o sentido próprio e peculiar da vocação divina dirigida aos fiéis leigos. Estes não são chamados a deixar o lugar que ocupam no mundo.

 

O Batismo não os tira de modo nenhum do mundo, como sublinha o apóstolo Paulo: “Irmãos, fique cada um de vós diante de Deus na condição em que estava quando foi chamado” (1 Cor 7, 24); mas confia-lhes uma vocação que diz respeito a essa mesma condição intra-mundana: pois, os fiéis leigos “são chamados por Deus para que aí, exercendo o seu próprio ofício, inspirados pelo espírito evangélico, concorram para a santificação do mundo a partir de dentro, como o fermento, e deste modo manifestem Cristo aos outros, antes de mais, pelo testemunho da própria vida, pela irradiação da sua fé, esperança e caridade”.

 

Dessa forma, o estar e o agir no mundo são para os fiéis leigos uma realidade, não só antropológica e sociológica, mas também e especificamente teológica e eclesial, pois, é na sua situação intra-mundana que Deus manifesta o Seu plano e comunica a especial vocação de “procurar o Reino de Deus tratando das realidades temporais e ordenando-as segundo Deus” (CFL, 15).

 

É preciso retornar ao essencial da natureza do laicato para que a Igreja seja de fato, como pede o Papa Francisco: “Uma Igreja em saída para as periferias existenciais”.

 

Padre João da Silva Mendonça Filho, SDB, é mestre em Educação pela Pontifica Universidade Salesiana de Roma/Itália com especialização em Metodologia Vocacional, e pós-graduado em Comunicação pelo SEPAC/SP e PUC/SP.

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