Lectio Divina: metodologia através dos séculos

Quarta, 12 Setembro 2012 16:05 Escrito por 
  O modelo de estudo e meditação é tão antigo quanto o cristianismo e, tal como a mística da fé, vem tocando os corações de seus adeptos desde então. A leitura orante aplicada na educação e evangelização dos jovens lhes desperta encantamento no contato com Deus. Estima-se que haja mais de 2,5 bilhões de exemplares da Bíblia Sagrada em todo mundo, e mais de 2.500 traduções de suas páginas nos dias de hoje. No mês de setembro, quando se comemora o Mês da Bíblia, o Boletim Salesiano destaca a Lectio Divina, a leitura orante, uma metodologia de leitura deste livro que remonta há mais de 1.000 anos e que continua atual, no desafio de propagar o conhecimento da palavra de Deus. Padre Edmilson Tadeu Canavarros dos Santos, vice-inspetor da Inspetoria de Campo Grande, MS, observa que os tempos de hoje são mais favoráveis à leitura da Bíblia. “Hoje temos mais pessoas alfabetizadas, além de uma vasta literatura que subsidia a Lectio Divina, quando a metodologia é aplicada. Certamente hoje temos mais pessoas com acesso à Palavra de Deus e com mais capacidade de entendê-la”, analisa.  

Metodologia

Se considerarmos que a metodologia da Lectio Divina foi criada no século III, a observação de padre Edmilson ganha ainda mais força. Naquela época, poucos tinham acesso às letras e tampouco aos livros. Orígenes, um dos maiores teólogos e escritores do começo do cristianismo, foi quem deu o primeiro formato à metodologia. No século XII, em plena Idade Média, o monge Guido II organizou a leitura orante em quatro passos: leitura, meditação, oração e contemplação. Desde então, o método passou a ser adotado nos mosteiros e restrito a eles até o Concílio Vaticano II, na década de 1950, quando ganhou novos contornos como meio de propagar o entendimento da Palavra de Deus.

Para o padre Edimilson, o método, também nos tempos atuais, é um valioso recurso para levar o Evangelho aos fiéis. “Aqui vemos outros benefícios de nossos tempos, já que a leitura se dá no idioma nativo.” O elemento de maior valor, entretanto, está no próprio objeto de estudo, como comprova na prática o grupo de leitura orante que, há sete anos, se reúne na Paróquia Santa Teresinha, na Zona Norte de São Paulo.

A reunião é feita todas as segundas-feiras, às 20h30, com cerca de 20 pessoas. Em entrevista ao salesiano cooperador Carlos Minozzi, dois paroquianos que fazem parte do grupo, Armando Limonette e Pedro Monteiro, falaram com entusiasmo dessa experiência: “Fazer a Lectio Divina às segundas-feiras nos deixa mais tranquilos para o resto da semana. A gente segue a vida naquela vibração do que leu e meditou até domingo”, relata Limonette. Monteiro diz: “Depois da reflexão do Evangelho, você fica com Deus. Naquele momento você vai fazer o maior silêncio possível, para que se ouça a voz interna de cada um”.

 

Na prática do jovem

Como afirma padre Edmilson, a leitura orante traz benefícios para a vida prática de adultos e também dos jovens. “A Palavra de Deus é instigante e sempre desperta a curiosidade, principalmente do jovem. Quebram-se muitos mitos e sua mensagem os agrega e deriva em um entusiasmo, porque é sempre dinâmica e envolvente.”

Luiz Antonio Opata, seminarista salesiano do município de Guarapuava, PR, coletou, junto aos participantes da Animação Missionária Juvenil (AMJ), realizada em julho deste ano, em Curitiba, PR, alguns valiosos depoimentos que evidenciam o despertar do interesse dos jovens com a leitura orante da Bíblia. “É necessária uma dinâmica renovada, mas com os mesmos passos da tradicional”, defende. “A leitura orante da Bíblia lhes foi oferecida objetivando um contato maior com a Palavra de Deus, e eles puderam ouvir, refletir, meditar e contemplá-la”, descreve.

O seminarista salesiano acredita que a partir do método, basta que haja um empenho do leitor, já que nas páginas do Evangelho estão reunidas informações implícitas de grande valor, mas que precisam ser extraídas nessas quatro etapas – leitura, meditação, oração e contemplação.

O contato diário com a palavra de Deus levou os jovens a uma experiência significante, pois muitos deles traziam referências apenas obtidas durante a catequese ou nos grupos de jovens. “Com o subsídio lançado para a Jornada Mundial da Juventude os ícones da anunciação, nascimento, morte, ressurreição de Jesus Cristo e da Santíssima Trindade são apresentados em uma cruz, e foram destacados para que eles pudessem ter um maior contato com a palavra”, explica Opata. O resultado, segundo o seminarista, está evidenciado pelos depoimentos extraídos de alguns dos participantes.

 

A mulher samaritana

Opata, em seu relato, ecoa o parecer de padre Edmilson, quando defende que o método, ao ser aplicado aos jovens ou em um contexto educativo, deve vir permeado dessa renovação. “Por isso recomendamos que a metodologia seja concentrada nos Evangelhos, pois eles estão mais próximos de nós, não só pelo contexto referenciado por outras obras ou meios de contato, mas também pelo histórico que, se bem explorado, promoverá um aumento do interesse e do entendimento das mensagens a serem extraídas”, explica o religioso.

“É importante ter respeito para com a Palavra de Deus, porque você toca o sagrado. Alguém que goste da literatura, que se aprofunde no texto, que tenha um conhecimento inicial do grego e do latim, por exemplo, ajuda muito a atrair a atenção desse público jovem que, apesar de curioso, tende a ser disperso e resistente à leitura”, analisa. Para dar a dimensão da importância desse conhecimento, padre Edmilson resgata o episódio descrito no livro de João, Capítulo 4, em que Jesus conversa com uma mulher samaritana, à beira de um poço, onde esta veio buscar água.

“Achava-se ali o poço de Jacó. Jesus, pois, cansado da viagem, sentou-se assim junto do poço; era cerca da hora sexta.

Veio uma mulher de Samaria tirar água. Disse-lhe Jesus: Dá-me de beber.

Pois seus discípulos tinham ido à cidade comprar comida.

Disse-lhe então a mulher samaritana: Como, sendo tu judeu, me pedes de beber a mim, que sou mulher samaritana?”

 

“Aqui o relato bíblico mostra uma série de informações históricas que merecem análise e tradução para o contexto presente, e que suscitam a discussão dos jovens. O resultado, invariavelmente, é a ampliação do entendimento e melhor aproveitamento de seus ensinamentos”, relata o padre. “Um judeu jamais dirigiria a palavra a um samaritano, ainda mais uma mulher. Os dois povos eram inimigos. O texto relata que Jesus menciona ‘seus maridos’, mas refere-se a seus senhores, seus deuses, a quem ela serve. Ademais, um homem dirigir a palavra a uma mulher desacompanhada também não eram modos daquela época... enfim, aqui se ilustra a riqueza de detalhes que se pode extrair de cada leitura para ser compartilhada com os jovens e no contexto educativo”, encerra padre Edmilson

A leitura da Palavra pode ser feita de muitas maneiras, mas a Lectio Divina continua um recurso atual, mesmo sendo uma metodologia muito antiga.

 

Depoimentos

Contemplação

“...Utilizamos meios mais atraentes para que a Palavra de Deus pudesse ser lida, meditada e contemplada, seguida de um gesto ou propósito diário sempre inspirado na leitura bíblica indicada pelo subsídio!”

Luiz Antonio Opata, SDB

 

Oração

“Foram trabalhados temas muito importantes na vida de cada um, e aprendemos temas que mostram o avanço de Jesus, começando com sua anunciação e chegando na Santíssima Trindade. Ou seja, ele retrata um pouco dessa semana que passamos. Começou na anunciação, na segunda-feira, quando fomos  anunciados na comunidade, e com o passar da semana a gente foi crescendo na fé e tornando-nos bons pastores, como Jesus.”

João Paulo Delgado, Guarapuava, PR

 

Meditação

“Foi muito bom ter o contato com a Palavra de Deus todas as manhãs, pois eu fazia uma comparação do texto com os dias de hoje. Muitas vezes a gente reclama das coisas que faz e não pensa naquela pessoa que é bem simples e não tem quase nada, como uma simples pessoa que nos salvou, que é Jesus Cristo!”

Eduardo Santana de Oliveira, Curitiba, PR

 

Leitura

“Quando se está em missão, tudo fica mais frágil e sensível em você. Todos os dias uma passagem bíblica era lida e meditada, e aquilo me guiava durante o dia. A sensação de ser guiada pela palavra de Deus é maravilhosa, fazendo com que me motivasse cada vez mais para seguir em missão. Deus sempre tem algo para nos mostrar, o que temos a fazer é permitir que ele nos mostre.”

Heloísa Vittória Brustolim Fonseca, Curitiba, PR

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Última modificação em Sábado, 20 Outubro 2012 11:32

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Lectio Divina: metodologia através dos séculos

Quarta, 12 Setembro 2012 16:05 Escrito por 
  O modelo de estudo e meditação é tão antigo quanto o cristianismo e, tal como a mística da fé, vem tocando os corações de seus adeptos desde então. A leitura orante aplicada na educação e evangelização dos jovens lhes desperta encantamento no contato com Deus. Estima-se que haja mais de 2,5 bilhões de exemplares da Bíblia Sagrada em todo mundo, e mais de 2.500 traduções de suas páginas nos dias de hoje. No mês de setembro, quando se comemora o Mês da Bíblia, o Boletim Salesiano destaca a Lectio Divina, a leitura orante, uma metodologia de leitura deste livro que remonta há mais de 1.000 anos e que continua atual, no desafio de propagar o conhecimento da palavra de Deus. Padre Edmilson Tadeu Canavarros dos Santos, vice-inspetor da Inspetoria de Campo Grande, MS, observa que os tempos de hoje são mais favoráveis à leitura da Bíblia. “Hoje temos mais pessoas alfabetizadas, além de uma vasta literatura que subsidia a Lectio Divina, quando a metodologia é aplicada. Certamente hoje temos mais pessoas com acesso à Palavra de Deus e com mais capacidade de entendê-la”, analisa.  

Metodologia

Se considerarmos que a metodologia da Lectio Divina foi criada no século III, a observação de padre Edmilson ganha ainda mais força. Naquela época, poucos tinham acesso às letras e tampouco aos livros. Orígenes, um dos maiores teólogos e escritores do começo do cristianismo, foi quem deu o primeiro formato à metodologia. No século XII, em plena Idade Média, o monge Guido II organizou a leitura orante em quatro passos: leitura, meditação, oração e contemplação. Desde então, o método passou a ser adotado nos mosteiros e restrito a eles até o Concílio Vaticano II, na década de 1950, quando ganhou novos contornos como meio de propagar o entendimento da Palavra de Deus.

Para o padre Edimilson, o método, também nos tempos atuais, é um valioso recurso para levar o Evangelho aos fiéis. “Aqui vemos outros benefícios de nossos tempos, já que a leitura se dá no idioma nativo.” O elemento de maior valor, entretanto, está no próprio objeto de estudo, como comprova na prática o grupo de leitura orante que, há sete anos, se reúne na Paróquia Santa Teresinha, na Zona Norte de São Paulo.

A reunião é feita todas as segundas-feiras, às 20h30, com cerca de 20 pessoas. Em entrevista ao salesiano cooperador Carlos Minozzi, dois paroquianos que fazem parte do grupo, Armando Limonette e Pedro Monteiro, falaram com entusiasmo dessa experiência: “Fazer a Lectio Divina às segundas-feiras nos deixa mais tranquilos para o resto da semana. A gente segue a vida naquela vibração do que leu e meditou até domingo”, relata Limonette. Monteiro diz: “Depois da reflexão do Evangelho, você fica com Deus. Naquele momento você vai fazer o maior silêncio possível, para que se ouça a voz interna de cada um”.

 

Na prática do jovem

Como afirma padre Edmilson, a leitura orante traz benefícios para a vida prática de adultos e também dos jovens. “A Palavra de Deus é instigante e sempre desperta a curiosidade, principalmente do jovem. Quebram-se muitos mitos e sua mensagem os agrega e deriva em um entusiasmo, porque é sempre dinâmica e envolvente.”

Luiz Antonio Opata, seminarista salesiano do município de Guarapuava, PR, coletou, junto aos participantes da Animação Missionária Juvenil (AMJ), realizada em julho deste ano, em Curitiba, PR, alguns valiosos depoimentos que evidenciam o despertar do interesse dos jovens com a leitura orante da Bíblia. “É necessária uma dinâmica renovada, mas com os mesmos passos da tradicional”, defende. “A leitura orante da Bíblia lhes foi oferecida objetivando um contato maior com a Palavra de Deus, e eles puderam ouvir, refletir, meditar e contemplá-la”, descreve.

O seminarista salesiano acredita que a partir do método, basta que haja um empenho do leitor, já que nas páginas do Evangelho estão reunidas informações implícitas de grande valor, mas que precisam ser extraídas nessas quatro etapas – leitura, meditação, oração e contemplação.

O contato diário com a palavra de Deus levou os jovens a uma experiência significante, pois muitos deles traziam referências apenas obtidas durante a catequese ou nos grupos de jovens. “Com o subsídio lançado para a Jornada Mundial da Juventude os ícones da anunciação, nascimento, morte, ressurreição de Jesus Cristo e da Santíssima Trindade são apresentados em uma cruz, e foram destacados para que eles pudessem ter um maior contato com a palavra”, explica Opata. O resultado, segundo o seminarista, está evidenciado pelos depoimentos extraídos de alguns dos participantes.

 

A mulher samaritana

Opata, em seu relato, ecoa o parecer de padre Edmilson, quando defende que o método, ao ser aplicado aos jovens ou em um contexto educativo, deve vir permeado dessa renovação. “Por isso recomendamos que a metodologia seja concentrada nos Evangelhos, pois eles estão mais próximos de nós, não só pelo contexto referenciado por outras obras ou meios de contato, mas também pelo histórico que, se bem explorado, promoverá um aumento do interesse e do entendimento das mensagens a serem extraídas”, explica o religioso.

“É importante ter respeito para com a Palavra de Deus, porque você toca o sagrado. Alguém que goste da literatura, que se aprofunde no texto, que tenha um conhecimento inicial do grego e do latim, por exemplo, ajuda muito a atrair a atenção desse público jovem que, apesar de curioso, tende a ser disperso e resistente à leitura”, analisa. Para dar a dimensão da importância desse conhecimento, padre Edmilson resgata o episódio descrito no livro de João, Capítulo 4, em que Jesus conversa com uma mulher samaritana, à beira de um poço, onde esta veio buscar água.

“Achava-se ali o poço de Jacó. Jesus, pois, cansado da viagem, sentou-se assim junto do poço; era cerca da hora sexta.

Veio uma mulher de Samaria tirar água. Disse-lhe Jesus: Dá-me de beber.

Pois seus discípulos tinham ido à cidade comprar comida.

Disse-lhe então a mulher samaritana: Como, sendo tu judeu, me pedes de beber a mim, que sou mulher samaritana?”

 

“Aqui o relato bíblico mostra uma série de informações históricas que merecem análise e tradução para o contexto presente, e que suscitam a discussão dos jovens. O resultado, invariavelmente, é a ampliação do entendimento e melhor aproveitamento de seus ensinamentos”, relata o padre. “Um judeu jamais dirigiria a palavra a um samaritano, ainda mais uma mulher. Os dois povos eram inimigos. O texto relata que Jesus menciona ‘seus maridos’, mas refere-se a seus senhores, seus deuses, a quem ela serve. Ademais, um homem dirigir a palavra a uma mulher desacompanhada também não eram modos daquela época... enfim, aqui se ilustra a riqueza de detalhes que se pode extrair de cada leitura para ser compartilhada com os jovens e no contexto educativo”, encerra padre Edmilson

A leitura da Palavra pode ser feita de muitas maneiras, mas a Lectio Divina continua um recurso atual, mesmo sendo uma metodologia muito antiga.

 

Depoimentos

Contemplação

“...Utilizamos meios mais atraentes para que a Palavra de Deus pudesse ser lida, meditada e contemplada, seguida de um gesto ou propósito diário sempre inspirado na leitura bíblica indicada pelo subsídio!”

Luiz Antonio Opata, SDB

 

Oração

“Foram trabalhados temas muito importantes na vida de cada um, e aprendemos temas que mostram o avanço de Jesus, começando com sua anunciação e chegando na Santíssima Trindade. Ou seja, ele retrata um pouco dessa semana que passamos. Começou na anunciação, na segunda-feira, quando fomos  anunciados na comunidade, e com o passar da semana a gente foi crescendo na fé e tornando-nos bons pastores, como Jesus.”

João Paulo Delgado, Guarapuava, PR

 

Meditação

“Foi muito bom ter o contato com a Palavra de Deus todas as manhãs, pois eu fazia uma comparação do texto com os dias de hoje. Muitas vezes a gente reclama das coisas que faz e não pensa naquela pessoa que é bem simples e não tem quase nada, como uma simples pessoa que nos salvou, que é Jesus Cristo!”

Eduardo Santana de Oliveira, Curitiba, PR

 

Leitura

“Quando se está em missão, tudo fica mais frágil e sensível em você. Todos os dias uma passagem bíblica era lida e meditada, e aquilo me guiava durante o dia. A sensação de ser guiada pela palavra de Deus é maravilhosa, fazendo com que me motivasse cada vez mais para seguir em missão. Deus sempre tem algo para nos mostrar, o que temos a fazer é permitir que ele nos mostre.”

Heloísa Vittória Brustolim Fonseca, Curitiba, PR

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